quinta-feira, 7 de julho de 2011

ROBERTO ROSSI 9/10

PARTE 9/10
Análise compreensiva da realidade mato-grossense
Roberto Rossi


Minha presença no mundo não é a de quem a ele se adapta, mas de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também da história  (Paulo Freire)


Sebastião Salgado (mãos)
*


IX. Perspectiva eclesial
Crise espiritual[1]
- Crise de sentido da vida, materialismo exacerbado, apego aos bens materiais e à acumulação de riquezas palpáveis. Esvaziamento do sentido espiritual da vida na Terra.
- Redução do Divino ao culto imediato do ter e do prazer, sem partilha.
- Mercantilização da religião.
- Enraizamento da cultura da exterioridade, típica da era patriarcal que estamos atravessando.
- Divórcio profundo entre o masculino e o feminino, e predomínio absoluto do masculino.
- Divórcio profundo entre o mundo humano e a Mãe-Natureza.
- Redução da relação com o Divino a cultos exteriores e momentos isolados da semana ou do mês.
- Culto do Ego, às custas do sentido maior da vida humana, da unidade da diversidade, da relação com o outro e com todas as formas de vida.
- Dogmatismos e fundamentalismos, apegos a verdades absolutas.
Tudo isso esvazia de sentido tanto a relação viva e dinâmica com o Divino quanto a ação pela transformação do mundo.

Tendências eclesiais
Em 2009, Libanio[2] faz uma análise da realidade sócio-eclesial e indica oito tendências possíveis para o presente e o futuro. Vejamos.

Religiosidade tradicional
- Valorizam-se na família a autoridade paterna e a religiosidade materna.
- Formação religiosa tradicional: catequese e ensinamento do magistério.
- Experiência religiosa: devoção aos santos e a Nossa Senhora.
- Predomina a submissão a deliberações de fora do sujeito sem questionamentos.
- Função do clero: orientar os fiéis com autoridade inquestionada.
- Vantagem: oferece segurança. A objetividade é confundida com comunhão.
- Promessa: sentido final para a vida na terra e além dela.
- Limite: restrições à liberdade e autonomia do sujeito.
- Possibilidade: tende a desaparecer.

Secularização em busca do humanismo
- Privilegia-se a consciência em relação às normas.
- Valorização da razão científica, da subjetividade e autonomia, as realidades humanas e a realização pessoal.
- Privilegia-se a dimensão existencial do ser humano e opta-se pela vida de Jesus.
- Vantagem: é válido para ateus e cristãos. Mostra o valor da imanência do humanismo sem perder a transcendência nele contido.
- Limite: ao acentuar o existencial, cai-se no subjetivismo. Perde-se a dimensão da alteridade e pouco se valoriza o social.
- Possibilidade: com a ascensão da cultura pós-moderna, tende ao crescimento e a maior adesão.

Ateísmo militante e sapiencial como realização humana
- Ateísmo aguerrido: combate a crença em Deus
- Ateísmo sapiencial: não combate a Deus, pois não é necessário. A sabedoria humana suprimi qualquer crença na existência divina.
- Característica: acentua a responsabilidade intransferível dos atos humanos sem recorrer a qualquer transcendência.
- Limite: não oferece respostas ao sofrimento humano, às injustiças sociais e o crescimento da pobreza.
- Possibilidade: liga-se à cultura do consumismo.

Compromisso social do cristão
- Características: manifesta-se na caminhada da CEBs e das pastorais sociais, desconstrução de práticas religiosas alienantes. Explicita-se a opção pelos pobres. Articula-se com os movimentos sociais na perspectiva da construção de uma nova sociedade.
- Revela o caráter libertador da fé.
- A dimensão relacional é fundamental e não a pura interioridade das consciências.
- Limite: o ambiente cultural atual afasta os cristãos desse compromisso, negação das utopias e valorização do presente.
- Possibilidade: dificuldade para reavivar esse caminho com o mesmo entusiasmo das décadas passadas.

Religiosidade pós-moderna carismática
- Característica: reaparecimento do paganismo. Autonomia do sujeito e negação da institucionalidade eclesial.
- Oferece respostas imediatas ao momento atual.
- Limite: busca o consolo em práticas espiritualistas, marginalizando o caráter ético e solidário do evangelho.
- Possibilidade: encontra força devido às características próximas da cultura pós-moderna.

Religiosidade do tudo vale
- Característica: subjetividade ao extremo. Tudo vale para satisfazer os sentidos e os desejos.
- Revela o hedonismo e egoísmo ao extremo, a radicalização do presente e a satisfação imediata do prazer.
- Limite: leva o afastamento da convivência com os outros.
- Possibilidade: esgotamento dessa proposta, pois seria a morte da cultura e da humanidade.

A via virtual
- Substitui-se as relações pessoais pelas relações virtuais através das mídias sociais.
- Surge um novo tipo de liberdade: encanto há prazer, permanece-se conectado. Ao menor sinal de insatisfação, basta deletar.
- Limite: crimes virtuais, patologias psíquicas.
- Possibilidade: tudo se reduz ao virtual, consequentemente, irresponsabilidade diante da vida, da convivialidade e do compromisso social.

O caminho do profissional, do executivo, do homem da instituição.
- A vida centra-se na profissão. A família, o sucesso, o dinheiro e o poder dependem da realização profissional.
- Prioriza-se o reconhecimento através do acúmulo de títulos. A qualificação e a especialização garantem sucesso e sensação de segurança.
- Limites: o preço existencial pago para alcançar o sucesso é alto.
- Possibilidade: tem lugar numa sociedade da concorrência. Pode chegar ao extremo da profissionalização ou a reação humanizante.

Estratégias necessárias
- Trabalhar pela transformação pessoal, pelo desenvolvimento em si da espiritualidade do cotidiano e da espiritualidade histórica e cósmica, construindo em si a nova mulher e o novo homem.
- Ensinar pelo exemplo e pelo testemunho, mais que pelas palavras.
- Superar a cultura patriarcal e machista.
- Promover a espiritualidade integrada com a ação social e política.
- Ajudar a juventude a dar sentido à sua vida.
- Introduzir e consolidar na própria vida o amor como acolhimento do outro.
- Trabalhar a dimensão simbólica da luta.



[1] Ideias de Marcos Arruda durante a Assembleia Nacional da CPT, em 2008. Não obstante o ano, sua reflexão ainda é muito atual e desafiadora.
[2] João Batista Libanio. Caminhos de existência. São Paulo: Paulus, 2009.

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