terça-feira, 26 de agosto de 2014

Ambiente fica à margem, apesar de Marina

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Ambiente fica à margem, apesar de Marina

A ascensão de Marina Silva, maior liderança da área ambiental no Brasil, à cabeça da chapa do PSB à Presidência, com chances reais de chegar ao segundo turno, não deve fortalecer o tema na agenda de campanha. A expectativa de analistas e ativistas que atuam na área é que ela será obrigada a adotar uma postura defensiva sobre suas próprias posições. EnquantoMarina dificilmente conseguirá abrir espaço para que seus adversários sejam confrontados, a presidente Dilma Rousseff (PT) deve buscar a polarização e Aécio Neves (PSDB) buscará espaço no debate econômico, em que é mais forte, para tratar do assunto.
A reportagem é de Renata Batista, publicada pelo jornal Valor, 25-08-2014
"Vejo com bons olhos a entrada de Marina porque ela simboliza esses temas, mas acho que muda pouco. A abordagem que se faz sobre a Marina é sempre na defensiva, para mostrar que ela não será um entrave. Ela também precisará falar sobre outros temas", diz Fábio Feldman, coordenador da área na equipe responsável pelo programa de governo do candidato do PSDB.
"Em 2010, nós priorizamos o tema educação porque a questão ambiental já está atrelada à imagem da Marina. Mas estou cheio de esperança de arrancar compromissos do governo nesse novo cenário", diz o deputado federal Alfredo Sirkis (PSB), que coordenou a campanha de Marina no Rio em 2010. Ele trabalha para conseguir um plano de estímulo à energia solar.
Até agora, o assunto tem ficado à margem. Um estudo realizado a pedido do Valor pelo projeto Media-Cloud Brasil, da Escola de Matemática Aplicada da Fundação Getulio Vargas (EMAp/FGV), indica que o tema sustentabilidade praticamente não aparece nesta campanha.
Embora os programas de governo das três principais coligações, registrados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tenham capítulos específicos sobre o assunto, a análise sobre o peso relativo de palavras e expressões ligadas ao tema de meio ambiente e sustentabilidade, por meio do que eles chamam de nuvem de palavras, mostra que elas desaparecem nos programas de Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PT). Apenas no programa do PSB, que teve o envolvimento do grupo de Marina Silva em sua elaboração, a palavra sustentável aparece com mais destaque, mas depois de política, desenvolvimento, qualidade e sociedade, entre outras menções com peso semelhante.
EMAp/FGV monitora mais de 60 mil sites de notícias e também levantou tudo o que foi publicado com citações aos candidatos e menções aos temas meio ambienteenergia e agronegócio. Somente no caso de Marina e de Eduardo Campos, morto na semana passada em um acidente aéreo, o tema meio ambientetem visibilidade maior que os demais. Mesmo assim, de forma geral, apareceu associado à questão de energia.
Outro levantamento, realizado pela consultoria E.Life entre seguidores dos quatro candidatos no Twitter (Campos e Marina, pelo PSB), mostra que o interesse dos eleitores pelo assunto também é limitado. A consultoria acompanha desde janeiro o mesmo grupo de seguidores de cada candidato. Um levantamento sobre tudo o que publicaram indica que, no caso de Marina, apenas 20% dos simpatizantes publicaram (ou retuitaram) mensagens com menções a ecologia e meio ambiente. Entre os seguidores de Dilma e Aécio, o interesse pelo tema é ainda menor: 14,3% e 11,5%, respectivamente, fizeram menções aos termos pesquisados.
As análises corroboram a avaliação de Feldman. Segundo ele, não há demanda da sociedade por essas discussões e nem as organizações da sociedade civil conseguem colocar o tema em pauta. Os candidatos até se preocuparam em tratar do assunto em seus programas, mas não aparece nos debates nem nas pautas das conversas e entrevistas. "Fui o primeiro coordenador escolhido pelo Aécio, fizemos um trabalho sério, mas não há oportunidade para discutir os assuntos", resume o ambientalista, para quem o assunto saiu da pauta após o fracasso da Conferência das Nações Unidas sobre asMudanças Climáticas de 2009. "O Armínio [Fraga] prometeu que vai falar de agricultura de baixo carbono em todas as suas falas. Será o Armínio falando", diz, na expectativa de atrair interesse para a agenda.
De acordo com uma fonte ligada ao PT, o tema não atrai o interesse da presidente Dilma e perdeu força no partido, de forma geral, após a saída de Marina. O nome mais emblemático na área ambiental é do senador Jorge Viana, que foi governador do Acre e militava junto com Marina. Ele não conseguiu, porém, se firmar nesse espaço no senado. "Os nomes do PT na Comissão de Meio Ambiente são pouco expressivos e a Izabella [Teixeira, ministra do Meio Ambiente] não tem estatura política, é funcionária de carreira", diz, lembrando que o ministério também perdeu força política com a transferência dos licenciamentos para Estados e municípios. "Só os projetos maiores ficam na esfera federal e, com esses, a Presidência se envolve diretamente", resume.
Na segunda-feira, com o nome de Marina confirmado e a pesquisa do Datafolha que a coloca em segundo lugar divulgada,Dilma conversou com Isabela no Palácio do Planalto. Até agora, porém, não há sinalização de mudança na abordagem da presidente, que visitou, no dia seguinte, as usinas hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia.
Para o analista da Eurasia, João Augusto Castro Neves, há muita dificuldade dos candidatos em firmar posição sobre o tema de uma forma eleitoralmente aceitável. Ele diz que as demandas da nova classe média em temas como mobilidade começam a abrir espaço. "Todo mundo é favorável à questão ambiental. A pergunta é se está disposto a arcar com os custos. Não é um tema que dá voto", resume, lembrando que os verdes só chegaram ao poder no mundo por meio de alianças.
Para Marina, diz Castro Neves, o maior risco é a dicotomia entre sustentabilidade e desenvolvimento. "Vão tentar fazer a polarização, lembrar da briga dela com Dilma, quando as duas eram ministras do Lula. É um debate rasteiro, mas em eleição vale tudo".
Na Confederação Nacional da Indústria (CNI), a avaliação também é que Marina terá uma longa pauta de temas sobre os quais se posicionar, mas que a chance de um debate mais amplo entre os candidatos é pequena. Um fonte ligada à entidade resume a questão da seguinte forma: "Dos 42 cadernos de propostas entregues aos candidatos, apenas um fazia referência ao meio ambiente, o que tratava de licenciamento ambiental".
"A discussão vai aumentar, mas com viés negativo, sobre o potencial dano que o meio ambiente pode causar aos negócios se for conduzido por Marina", acrescenta, citando o projeto de lei que agiliza o licenciamento ambiental e acaba de ser aprovado na Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, como um dos temas que causam apreensão na indústria.
Para Gesner Oliveira, da consultoria GO Associados, o desafio da candidata será associar a questão a uma nova agenda de desenvolvimento econômico. "Uma posição defensiva de Marina seria lamentável. Essa oposição entre sustentabilidade e crescimento econômico é falsa. Se atacarmos nossos principais problemas ambientais, podemos gerar emprego", diz, citando a demanda por saneamento como um dos exemplos.
No grupo mais ligado à candidata do PSB, porém, a expectativa é que ela reafirme suas posições. "A Marina vai ser muito questionada e, se convencer, está eleita, mas algumas posições são muito difíceis, principalmente porque ela não vai desistir do Rede Sustentabilidade", avalia um aliado.

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