segunda-feira, 20 de outubro de 2014

Revelado documento secreto que cataloga “inimigos” durante Guerra Civil em El Salvador

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Marcela Belchior
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A Comissão de Direitos Humanos de El Salvador (CDHES) acaba de revelar, publicamente, um documento confidencial das Forças Armadas (FAES) do país em que são registradas ações do serviço de inteligência governamental durante a Guerra Civil, que ocorreu no território nacional entre os anos 1980 a 1992. O chamado Livro Amarelodemonstra como foram cometidos crimes pelos militares, contendo uma lista de quase 2 mil pessoas identificadas, fotografadas e que, em grande parte, foram capturadas ou mortas.

O documento confirma o envolvimento da Força Armada em crimes de homicídio, tortura e desaparecimentos forçados durante a Guerra Civil. Foto: Reprodução.


Assinalados no livro como "terroristas delinquentes”, os alvos eram pessoas ligadas à Frente Farabundo Martí de Liberação Nacional (FMLN), partido político de oposição criado a partir de cinco organizações guerrilheiras, mas também a sindicatos e partidos de tendência direitista. Entre eles figura o atual presidente da República, Salvador Sánchez Cerén, um dos principais dirigentes da FMLN que, em 1970, participou da criação da primeira organização armada de esquerda no país, a Forças Populares de Libertação Farabundo Martí (FPL).
Do total de nomes identificados no livro, 43% se referem à lista de desaparecimentos forçados ou de pessoas que tiveram direitos humanos violados. Os casos foram denunciados tanto pelas próprias vítimas quanto por seus familiares, diante de organizações humanitárias salvadorenhas e da Organização das Nações Unidas (ONU), ainda nos anos do conflito.

O Livro Amarelo contém 270 páginas com nomes, fotos e outras informações dos insurgentes perseguidos pelo Exército. Foto: Reprodução.


A difusão do Livro Amarelo representa a suplantação de anos de táticas obstrucionistas por parte do Exército e de outras forças de segurança de El Salvador, e se localiza em um contexto político no qual o país busca reavaliar a história das violações aos direitos humanos durante o conflito. Como afirma o diretor da Comissão de Direitos Humanos, Miguel Montenegro, a apresentação do Livro Amarelo é uma maneira de superar a impunidade que ainda existe no país a respeito da guerra. "Lá estão os nomes e sobrenomes de quem foi assassinada e assassinado pelas Forças Armadas de El Salvador”, declarou à imprensa.
Montenegro destaca que o livro deverá gerar grande impacto e diz esperar repercussão nacional e internacional no que tange ao respeito aos direitos humanos, fazendo-se conhecer os fatos que construíram o conflito e pressionando por justiça em torno dos responsáveis pelas violações. O diretor da Comissão exige que a Corte Suprema de Justiça (CSJ) de El Salvador discuta a Lei de Anistia do país, que ele considera inconstitucional, para penalizar quem cometeu crimes de guerra.
Para isso, parte das provas está contida no documento. Além de identificar os militantes que estavam na mira do Exército salvadorenho, o registro também revela uma lista de defensores de direitos humanos, líderes sindicais e outras figuras políticas. Muitos deles foram vítimas de detenções ilegais, tortura, execução extrajudicial, desaparecimento forçado, entre outras violações.

Presidente Salvador Sánchez Cerén catalogado no livro (à esquerda) e na atualidade. Foto: Reprodução.

O Livro Amarelo é o primeiro documento militar confidencial, proveniente dos próprios arquivos do Exército, que se torna público em El Salvador e, até o momento, a única prova da violação de direitos com perseguição, vigilância e desaparecimento de cidadãos/ãs durante a Guerra Civil. Publicado na Internet, o registro também traz uma série de documentos provenientes de arquivos estadunidenses, nos quais se evidencia a participação da CIA (Central Intelligence Agency), do Governo dos Estados Unidos, e de outros serviços de repressão.
Entenda o conflito
Embora nunca tenha sido declarado de maneira oficial, o período conhecido por Guerra Civil de El Salvador foi um conflito bélico interno. Nele, se enfrentaram as Forças Armadas de El Salvador, encarregada de defender a soberania do Estado, contra as forças insurgentes da FMLN.
O confronto armado repercutiu na morte ou desaparecimento de pelo menos 75 mil salvadorenhos/as civis mortos e 8 mil desaparecidos/as em 12 anos de embate. A guerra civil foi encerrada após um processo de diálogo entre as partes e a assinatura do acordo de paz, que permitiu a desmobilização das forças guerrilheiras e sua incorporação legal à estrutura política do país.
Saiba mais sobre a luta por justiça às violações de direitos humanos na Guerra Civil de El Salvador em depoimentos de vítimas do conflito:

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Marcela Belchior

Jornalista da ADITAL

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