quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

CARTA DE CÁCERES



CARTA DE CÁCERES

Os participantes do Seminário sobre Impactos dos Empreendimentos Hidrelétricos na Bacia do Alto Paraguai reunidos em Cáceres, Mato Grosso, no dia 13 de dezembro de 2011, organizado pelo Ministério Público Estadual e entidades parceiras, realizado na Câmara de Vereadores vem a público manifestar sua preocupação em relação à proliferação da implantação de empreendimentos hidrelétricos na Bacia do Alto Paraguai – BAP, sem a devida análise e planejamento. Atualmente são 44 empreendimentos em operação e mais 82 previstos, que vão influenciar diretamente uma das mais importantes planícies inundáveis do planeta, que cobre 140 mil quilômetros quadrados em território brasileiro além de importantes áreas na Bolívia e Paraguai. As alterações ambientais causadas por estes empreendimentos tem impactos sobre a dinâmica ecológica do Pantanal e, por conseguinte, sobre a cultura dos povos pantaneiros.

Considerando que cerca de 70% do potencial hidrelétrico da Bacia do Alto Paraguai já está instalado e que os 30% restantes não corresponderiam a 1% da produção de energia para o país num horizonte de 10 anos, dever-se-ia avaliar a real necessidade de um aproveitamento total em detrimento da conservação do bioma. Considerando ainda que o barramento para a exploração deste potencial impactaria praticamente todos os rios que formam o Pantanal, em especial no que se refere à conservação do funcionamento hidroecológico do Pantanal (pulso de inundação), responsável, por exemplo, pela produção pesqueira, serviço ecossistêmico de importância socioeconômica e cultural para os povos e comunidades tradicionais do Pantanal, bem como, para o turismo; e

Resolvem:
Manifestar apoio às ações desenvolvidas pelo Comitê Popular da Bacia do Rio Paraguai, pelo Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio Sepotuba e, de modo especial, pelo Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Mato Grosso e Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul em defesa da Bacia do Alto Paraguai; e

Reivindicam:
- A suspensão do licenciamento (pelas OEMAs e Ibama), da outorga do uso da água (pelas OEMAs e ANA) e da autorização dos empreendimentos hidrelétricos (pela ANEEL), na Bacia do Alto Paraguai;

- A realização de estudos que avaliem os impactos conjuntos causados pelos 126 empreendimentos no funcionamento hidro-ecológico do Pantanal, através de processos de avaliação de impactos ambientais cumulativos;

- O reconhecimento do Comitê Popular da Bacia do Rio Paraguai e a criação do Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Rio Paraguai;

- O respeito à Resolução Conama n.º 01/86, que prevê a análise integrada de impactos de empreendimentos, em nível da bacia hidrográfica;

- A consideração do hidrograma ecológico como ferramenta de regulação do funcionamento dos reservatórios já construídos, em detrimento da máxima geração de energia, seguindo os preceitos da gestão ecossistêmica de recursos hídricos;

- O respeito aos meios e modos de vida dos povos e comunidades tradicionais e o uso dos seus territórios na Bacia do Alto Paraguai, deixando os rios livres de barragens e outros empreendimentos;

- O respeito ao Decreto Federal n.º 7.342, de 26 de outubro de 2010 em relação à mitigação de impactos socioecômicos sobre as famílias atingidas por empreendimentos hidrelétricos na BAP, sob a responsabilidade do Comitê Interministerial de Cadastramento Socioeconômico – MME;

- A consideração das recomendações do Workshop Internacional sobre o tema realizado no VIII Intecol, 2008  (Congresso Internacional de Áreas Úmidas:  http://www.cpap.embrapa.br/publicacoes/online/DOC102.pdf), do documento resultante da 1ª Expedição às Nascentes do Rio Paraguai de 2010, do Estudo do Desenvolvimento Integrado da Bacia do Alto Paraguai- EDIBAP, do Plano de Conservação da Bacia do Alto Paraguai- PCBAP, do documento sobre áreas prioritárias para conservação, uso sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade brasileira – MMA, do projeto denominado Implementação de Práticas de Gerenciamento Integrado de Bacias Hidrográficas para o Pantanal e a Bacia do Alto Paraguai (GEF Pantanal), entre outros;

- A suspensão de quaisquer empreendimentos e obras que venham prejudicar a integridade ambiental do bioma e a integridade cultural, social, econômica, ambiental e ancestral dos povos e comunidades tradicionais do Pantanal, inclusive a retirada imediata do Projeto de Hidrovia Paraguai-Paraná do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC e de outros planos e programas estaduais, regionais e municipais sobre o tema;

- Que sejam disponibilizados nos orçamentos da União, Estados, Municípios, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, por meio dos fundos ambientais de âmbito federal, estadual e municipal, recursos para financiamento de programas de educação ambiental, de conservação e recuperação de nascentes e matas ciliares dos rios da BAP, sob a responsabilidade das IES e sociedade civil organizada;

- Que, a exemplo da sociedade civil organizada, o Ministério Público proporcione a integração com Ministérios Públicos dos países vizinhos, possibilitando, inclusive, a responsabilização internacional de agentes causadores de degradação ambiental na BAP e Bacia do Paraguai;

- A regulamentação do Fundo Estadual previsto na Política Estadual de Recursos Hídricos do Estado de Mato Grosso.

E, por fim, os membros do Ministério Público brasileiro presentes no Seminário reiteram o compromisso de promover todas as medidas judiciais e extrajudiciais necessárias à defesa da sociobiodiversidade no Pantanal.


Cáceres, 13 de dezembro de 2011.

A presente Carta é fruto das discussões ocorridas entre as instituições, associações e coletivos abaixo relacionadas:

1 – Sociedade Fé e Vida;

2 – FLEC – Fórum de Lutas das Entidades de Cáceres;

3 – Grupo Sociocultural e Ambiental Raízes;

4 – UNEMAT/Campus Cáceres;

5 – Centro de Direitos Humanos;

6 – IFMT – Instituto Federal de Mato Grosso;

7 – Ministério Público Federal

8 - Ministério Público do Estado de Mato Grosso;

9 – Secretária Municipal de Agricultura;

10 – MST – Movimento Sem Terra;

11 – STR – Sindicato dos Trabalhadores Rurais;

12 – Colônia de Pescadores Z-2;

13 – Instituto de História e Geografia de Cáceres;

14 – Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras;

15 – SINDSEF – Sindicato dos Servidores Públicos Federais/Cáceres;

16 – Instituto ECO-Pantanal;

17 – Centro de Pesquisa do Pantanal – CPP/SINERGIA;

18 – Comitê Popular da Bacia do Rio Paraguai;

19 – Comitê de Bacias do Rio Sepotuba;

20 – Escola Onze de Março – Ensino Médio Integrado/Técnico em Meio Ambiente;

21 – Polícia Militar Ambiental/Cáceres;

22 – Associação dos Pescadores Profissionais de Cáceres – APPEC/MT;

23 – Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua em Cáceres;

24 – SINASEFE - Sindicato Nacional dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica

25 - Mandato Coletivo do vereador Alonso;

26 – Comissão do Povo Chiquitano de Cáceres;

27 – Câmara Municipal de Cáceres


Rio Paraguai
fonte: Centro Burnier Fé e Justiça

Nenhum comentário:

Postar um comentário