Uma vítima de queimaduras severas causadas por resíduos tóxicos protesta em frente ao tribunal em Abidjan, em 2008.
Relatório expõe a falha em prevenir o despejo de resíduos tóxicos na África Ocidental 
A Anistia Internacional e o Greenpeace apelam por uma investigação criminal
O relatório conjunto da Anistia Internacional e do Greenpeace concluiu que a Trafigura, uma multinacional por trás do despejo de resíduos tóxicos, em 2006, em Abidjan, na Costa do Marfim que levou mais de 100 mil pessoas a procurar assistência médica deve ser investigada criminalmente no Reino Unido.
Verdade Tóxica é o resultado de uma investigação de três anos e fornece um levantamento profundo de uma sequência trágica de falhas que ocasionou um desastre médico, político e ecológico. Detalha também como leis existentes criadas com o objetivo de prevenir tragédias como esta, foram desprezadas e diversos governos falharam ao impedir o progresso do navio cargueiro Probo Koala e a sua carga tóxica quando este rumava para Abidjan.
O relatório questiona também a legalidade de um acordo negociado na Costa do Marfim que permitiu que a Trafigura evitasse um processo judicial pelo papel que desempenhou no despejo dos resíduos tóxicos. Através de entrevistas realizadas tanto com as vítimas do despejo tóxico quanto com especialistas médicos que as trataram, o relatório apresenta uma nova perspectiva do impacto devastador que o despejo tóxico causou.
“Seis anos se passaram desde que se permitiu a ocorrência desta terrível tragédia” disse Salil Shetty, Secretário Geral da Anistia Internacional. “É hora da Trafigura ser obrigada a encarar a responsabilização legal pelo acontecido. O governo da Costa do Marfim assim como os governos europeus não aplicaram as leis vigentes e falharam com os moradores de  Abidjan. As vítimas ainda esperam por justiça e não há garantias de que este tipo de crime corporativo não se repetirá.”      
“Esse é um caso de crime corporativo, de abuso de direitos humanos e de falha do governo em proteger vidas e o meio ambiente. É um caso que expõe como os sistemas de implementação da lei internacional não foram capazes de acompanhar empresas que operam transnacionalmente e como uma companhia foi capaz de tirar vantagem de incertezas legais e lacunas jurisdicionais, com consequências desastrosas” disse o diretor-executivo do Greenpeace Kumi Naidoo. “Não é tarde demais para que justiça seja feita, para os moradores de Abidjan sejam plenamente informados sobre os despejos e para que a Trafigura pague por seus crimes. Somente assim esperamos evitar quaisquer repetições deste tipo de desastre.” 
Os resíduos foram originalmente levados à Holanda, e na ocasião a Trafigura rejeitou a opção correta de seu tratamento, pois achou o preço proposto muito alto.  Apesar das preocupações sobre a natureza do lixo tóxico, as autoridades holandesas permitiram que o mesmo deixasse o país – uma violação séria das obrigações legais da Holanda.
Em 2007, um acordo extrajudicial foi alcançado no qual o governo da Costa do Marfim garantiu à Trafigura imunidade judicial. Em um processo civil movido por algumas das vítimas nos tribunais do Reino Unido, a Trafigura chegou a um outro acordo, mais uma vez apostando na não responsabilização. Um tribunal holandês declarou a companhia culpada da exportação ilegal de lixo tóxico da Holanda, mas a promotoria se recusou em ir além e incorporar ao processo os eventos subseqüentes em Abidjan ou seu impacto na saúde humana.
“Ainda não estamos cientes dos fatos” declarou Genevieve Diallo que mora próxima aos locais de despejo de lixo em Abidjan. “Os responsáveis devem ser punidos. Aqueles que são realmente culpados ainda não foram punidos.”
O relatório propõe ainda recomendações abrangentes sobre como a comunidade internacional pode garantir que uma tragédia como esta não se repita. Inclui diretrizes claras de como assegurar que empresas com operações transnacionais não possam fugir da responsabilização total por abusos de direitos humanos ou do meio ambiente. 
O governo do Reino Unido deve iniciar uma investigação criminal sobre o papel desempenhado pela Trafigura no despejo do material tóxico, já que o braço britânico da operação da Trafigura foi responsável por uma sucessão de decisões-chaves que conduziram ao desastre.
O governo da Costa do Marfim precisa assegurar que as vítimas recebam indenização integral. Além disso, deve reavaliar a legalidade do acordo que fez com a Trafigura garantindo-lhe imunidade no país.
O lixo tóxico despejado em Abijadan é classificado como perigoso de acordo com a Convenção de Basiléia – responsável por controlar os movimentos transfronteiriços de resíduos perigosos e seu manejo eficiente – sendo que a sua exportação sem consentimento é crime.
O relatório foi anunciado no momento em que os países participantes da Convenção de Basiléia se reúnem em Genebra, proporcionando assim uma oportunidade para garantir que lixo tóxico resultante de processos industriais a bordo de embarcações de carga não possam novamente ser descartados em países mais pobres.
Notas complementares

1. A Trafigura foi contada a fim de responder as alegações presentes no relatório. O posicionamento da Trafigura foi: “o relatório contém inexatidões significativas e declarações enganosas. O relatório simplifica demasiadamente questões legais complexas, analisa-as com base em pressupostos mal fundamentados, chega a conclusões seletivas que não refletem adequadamente a complexidade da situação ou dos processos legais. Os tribunais de cinco jurisdições distintas revisaram aspectos diferentes do incidente, e decisões e acordos de compensação foram negociados. É simplesmente errado sugerir que as questões não tiveram o controle judicial correto”.  
A Trafigura não esclareceu à Anistia Internacional ou ao Greenpeace Internacional quais eram as imprecisões, declarações enganosas ou questões demasiadamente simplificadas.