terça-feira, 9 de outubro de 2012

Passo Piraju, a um passo da cova

egon heck
http://egonheck.blogspot.com.br/


TERÇA-FEIRA, 9 DE OUTUBRO DE 2012

Passo Piraju, a um passo da cova


 

Querem decididamente a comunidade kaiowá Guarani, embaixo da terra, há sete palmos.  Conforme pedido do senhor Esmalte, confirmado pelo juiz de primeiro grau, já em 2004 " O MM. juiz de primeiro grau, então, determinou seja o cacique Carlitos de Oliveira advertido a não mais autorizar, incentivar ou permitir que os indígenas sob sua chefia ingressem na propriedade do autor e que a FUNAI providencie "a retirada dos índios da margem da propriedade do autor, assentando-os em local distante" (f. 159).

Quase uma década de tribulação, tormento e desassossego permanente. Talvez seja a comunidade Kaiowá Guarani da Terra Indígena Passo Piraju, emblemática de uma comunidade indígena sitiada, cercada de soja, cana e ódio. "Reduzidos sim, mas não vencidos", diziam comunidades indígenas da Amazônia, quando da Marcha e Conferência Indígena do ano 2000.

Neste período vi as lágrimas deslizando no rosto de Carlitos, ao narrar tudo que passou nas décadas de luta pela terra e vida de seu povo. Ele recebeu a visita de dezenas de personalidades e delegações de Direitos Humanos e aliados, do Brasil e do mundo. Narrou com a mesma dignidade e fidelidade os acontecimentos, desde a expulsão de seu pai e comunidade do Passo Piraju, da área onde hoje se encontram.

Apesar de doenças, mortes, tensões e conflitos, pressões e enganações de toda ordem, Carlitos e sua comunidade,enfrentaram todas essas adversidades com muita fé e convicção de que Tupã, Nhanderu fará um dia justiça para seu povo. Agora se encontra diante de uma nova ordem de despejo.

A pergunta crucial que fica é o que se quer de fato dos Kaiowá Guarani. Serão os sete palmos de terra, para consumar de vez o genocídio nunca estancado? Para os arautos dos decretos e

 

praticas de extermínio é muito mais importante ampliar as lavouras de soja, uma vez que na bolsa de valores a cotação do grão maldito está alto, bem acima da vida de qualquer indígena.

Dos 43 indígenas assassinados neste ano, conforme dados divulgados pelo Cimi, mais de 60% ocorreram no Mato Grosso do Sul, confirmando a triste estatística de campeão de violência contra os povos indígenas. Com certeza ações de reintegração de posse, além de ser um ato de violência em si, propiciam o desencadear de mais violências e mortes. No Estado recentemente três reintegrações de posse foram expedidas: Pueblito Kuê-Mbarakay (Iguatemi) Kadiwéu (Bodoquena) e agora Passo Piraju (Dourados)

Para Eliseu Lopes, representante da Aty Guasu na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil- APIB, é inconcebível que se continue provocando mais violência ao invés de resolver o problema das terras indígenas de uma vez. Ele está participando de vários iniciativas dos Direitos Humanos "para que haja uma somatória de forças para impedir a continuação da violação dos direitos do nosso povos Kaiowá Guarani", afirma Eliseu. Ele está cobrando do governo e em especial da Funai, a urgente publicação dos relatórios de identificação de todas as terras indígenas no Mato Grosso do Sul. "A APIB continua exigindo a revogação da portaria 303 da AGU, que é uma das causadoras de violência.

Nesta semana foi instalada em Amambai um grupo de 20 integrantes da Força Nacional, para evitar a violência contra a população indígena em 12 municípios da fronteira com o Paraguai.Se espera uma ação eficaz, especialmente em áreas em que as lideranças estão ameaçadas de morte,como em Arroio Korá.

Comissão da Verdade Indígena

Até que enfim neste país se resolve começar a fazer justiça,ou ao menos dar visibilidade, às violências, crimes, torturas e mortes contra comunidades indígenas em todo o país, ocasionando milhares de mortes. Embora tardiamente, e possivelmente contra a vontade de setores das elites do país, à semelhança da Comissão Camponesa.

Para  o ex-secretário do Cimi, Saulo Feitosa a instauração de uma Comissão de Verdade Indígena, além de um valor simbólico muito grande, traz em seu bojo a possibilidade ( e necessidade) de uma reparação aos povos afetados.

Egydio Shwade e a Comissão da Verdade em Manaus estarão entregando, na próxima semana um relatório com mais de 200 documentos comprovando o massacre de mais de 2 mil Waimiri Atroari, por ocasião da construção da estrada BR 194 que liga  Manaus(AM) a Boa Vista (RR). A estrada foi construída durante a ditadura militar, nas décadas de 60 e 70.

Esse será um momento importante para esclarecer a morte de mais de 1.500 Yanomami, em decorrência da invasão de seu território, especialmente por garimpeiros e empresas mineradoras., na década de 80. Também será o momento de esclarecer os massacres dos Juma (Tapauá-AM), do massacre do paralelo 11, Cinta Larga, dentre muitos outros. Quem sabe se comece a reescrever a história fazendo justiça a esses povos.

 

Egon Heck -www.egonheck.blogspot.com.br

Povo Guarani Grande Povo

Cimi 40 anos, 9 de outubro de 2012


SEGUNDA-FEIRA, 1 DE OUTUBRO DE 2012

Depois da eleição, o furacão da mineração em terras indígenas



Remover a terra, numa guerra desigual e insaciável, em busca do vil metal! Eis a nova batalha anunciada. As vítimas serão mais uma vez os povos indígenas, que  verão enormes máquinas adentrarem seus territórios, rasgarem o ventre da mãe terra e dela extraírem riquezas para saciar sua voracidade de acumulação de capital e poder.  Mineradoras do mundo inteiro estão com suas máquinas apostas, aguardando apenas o sinal verde da aprovação do projeto que regulamente a exploração mineral em terras indígenas. O relator da Comissão Especial criada na Câmara dos Deputados, Edio Lopes, já anunciou que seu relatório está pronto e estará sendo colocado em votação logo depois das eleições. " Pelas contas do relator, há quase 10 mil requerimentos de pesquisa de lavra, 150 pedidos de lavra e 10 títulos de lavra que incidem sobre terras indígenas " Autor do projeto de Lei é o senador Romero Jucá, de Roraima, que tem enormes expectativas na aprovação, pois parentes seus tem mineradoras naquele estado. O projeto 1610/96 tramita no Congresso há mais de 15 anos. Os povos indígenas e seus aliados já se pronunciaram inúmera vezes contrários à aprovação entendendo que essa questão deve ser apensada  ao Estatuto dos Povos Indígenas.

Em vários encontros os  indígenas tem se posicionado contrários à mineração em seus territórios.  Eles exigem que não apenas sejam consultados a respeito, mas que tenham poder de veto.

Os povos indígenas no Brasil sabem o que significa, em termos de impacto e destruição, a mineração nas terras indígenas.  Por ocasião da constituinte na década de oitenta os interesses minerais nacionais e mundiais tentaram inviabilizar os direitos indígenas na nova Constituição. Montaram uma campanha midiática contra os povos indígenas e seus aliados, como o Cimi, jamais vista na recente história do país.

Os povos indígenas na América latina sustentam uma luta secular contra o saque e destruição que a mineração vem promovendo em seus territórios. Na Bolívia, no Peru e Equador existe uma luta ferrenha contra a predatória e genocida exploração mineral em territórios indígenas, desde os Antes até a Amazônia.

A voracidade e truculência do poder mineral no mundo nunca se conformou com o dispositivo constitucional  que exige uma regulamentação especial para  a exploração mineral em terras indígenas. Em vários momentos tentaram a aprovação no Congresso desse projeto de lei. Aos sobrevivente caberá contar a desgraça anunciada.

Eleições e primavera

Para os povos indígenas as eleições são apenas mais um momento de tapas nas costas, promessas de benefícios imediatas, sorrisos e rostos farisaicamente simpáticos. Para alguns, dos mais de 200 candidatos indígenas a vereador, é também o momento de levar a reflexão política para dentro das aldeias, para mostrar as possibilidades e limites de participar desse ritual da democracia formal, representativa ( tão diferente da democracia comunitária participativa das aldeias!) É provável  que mais de trinta lideranças indígenas sejam aprovados no ritual das urnas e tenham quatro anos de mandato, no estranho e complicado ninho das câmaras dos vereadores. Boa sorte aos que  como Otoniel  Kaiowá Guarani, buscam a reeleição,  na estreita margem de luta pelos direitos de seu povo, especialmente à terra e os recursos naturais nelas existentes.

A primavera explode em beleza rara, no serrado em flor. A cagaita com suas minúsculas flores e folhas de cores variadas são de encher os olhos e regar o coração, numa infinita série maravilhosa de imagens gravadas em nossos atentos olhares. As flores do pequizeiro recebem inúmeras abelhas entre seus brancos filetes com bolinhas nas pontas. As árvores que há poucos dias espetavam o céu desnudas, agora colocam suas novas vestes para engalanar a primavera com seus verdes tons, e sons dos pássaros, das cigarras e inúmeros viventes encantados.

No embalo da primavera a vida é mais vida, a esperança galopa na beleza abundante da natureza que renasce em cada olhar atento e desabrocha em gratidão à mãe terra.

No dia da " pacificação"

Convite irrecusável. Colegas do Cimi em Florianópolis convidaram para falar da "Vivência com os Povos Indígenas", e juntamente com o Kaiowá Guarani Elizeu Lopes, debater a situação dos povos indígenas no Mato Grosso do Sul.  Não poderia deixar de falar sobre a trajetória de luta e compromisso com os povos indígenas, uma vez que foi com os Kaingang, Guarani e Xokleng que inicie a trajetória de 40 anos de aprendizado e luta com os habitantes primeiros desta terra. Eram quase 100 alunos indígenas de um curso de licenciatura na Universidade Federal de Santa Catarina.

Ao final da conversa os Xokleng pediram um tempo para apresentar algo sobre a data de 22 de setembro, que além do início da primavera, para eles tinha um significado especial. Faziam exatos 98 anos em que eles decidiram fazer contato pacífico com os brancos. É considerado o dia da "pacificação", ou seja, quando eles decidiram manter contato com a equipe de atração do Serviço de Proteção ao Índio- SPI. Assim como os Kaingang os Xokleng se mantiveram isolados e resistentes ao contato até o início do século 20. E a resistência deles foi a razão da criação do SPI, em 1910.

Egon Heck  -www.egonheck.blogspot.com.br  - Cimi 40 anos, inicio de primavera de 2012

Nenhum comentário:

Postar um comentário