sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Brasil devia se orgulhar de seus indígenas e não violentá-los, diz Giba

CENTRO BURNIER
http://centroburnier.com.br/wordpress/?p=3306


Brasil devia se orgulhar de seus indígenas e não violentá-los, diz Giba

Por Keka Werneck, da Assessoria de Imprensa do Centro Burnier Fé e Justiça
O geógrafo Gilberto Vieira dos Santos, de 41 anos, o Giba, não tem a menor dúvida de que deveríamos ter enorme orgulho dos povos indígenas brasileiros. Mas o que ocorre é justamente o contrário. Os indígenas que vivem no Brasil – 817 mil, conforme o Censo de 2010 do IBGE, de 305 etnias – seja em aldeias ou nas cidades, são vítimas de rotineiros preconceitos e violências.
Essas violências têm sido registradas a cada dia com maior grau de gravidade.
O caso mais grave em destaque no momento, que sensibilizou muita gente por todo o Brasil, é a situação dos Guarani-Kaiowá, do território Pyelito, em Mato Grosso do Sul (MS), nossos vizinhos.
Para falar sobre essa questão e outras questões indígenas, leia entrevista com Giba, que coordena o Conselho Indigenista Missionário de Mato Grosso (CIMI-MT), desde 2007, em uma diretoria colegiada.
Quando ainda morava em São Paulo, ele tomou contato com questões indígenas, sobretudo das etnias Tapirapés e Karajás, através do Centro Ecumênico de Serviços à Evangelização e Educação Popular (CESEP), que promove cursos de verão para movimentos populares na PUC de SP, dos quais participava como voluntário. Teve o convite e aceitou morar  3 anos na aldeia Tapirapé em Confresa no Nordeste de Mato Grosso, prelazia de São Félix do Araguaia, que tem como ícone Dom Pedro Casaldáliga. “Inclusive casei na aldeia”, lembra Giba, se referindo à esposa com quem tem um filho, Augusta Eulália Ferreira, 37, que é pedagoga e também compõe a diretoria colegiada do CIMI-MT, junto com Edina Franco de Moraes.
Lembranças da cerimônia de casamento
Ao lado de Dom Pedro Casaldáliga
Três anos vivendo na aldeia
O histórico de militância de Giba tem início na Pastoral da Juventude (PJ), como porta de entrada para as lutas em prol dos direitos humanos, e a Comissão Pastoral da Terra (CPT), daí a sua monografia de conclusão de curso ter sido feita sobre a questão fundiária do Pontal do Paranapanema, região Oeste do Estado de São Paulo.
Questões indígenas como a de Marãiwatsédé e Guarani-Kaiowá são históricas e estouraram agora ou surgiram mesmo várias questões indígenas pontuais?
Acredito que os problemas de fato são muito antigos. O que tem talvez os tornado mais intensos agora é a conjuntura política, econômica, governamental, muito favorável aos que sempre foram os violadores dos direitos indígenas.
Por exemplo quem?
Por exemplo o setor do agronegócio, que tem respaldo do Governo Federal, na composição do Senado e na Câmara de Deputados, assim como da Assembleia Legislativa de Mato Grosso. Os empresários do campo a cada século têm se fortalecido e fortaleceram também a luta contra os indígenas, quilombolas, pequenos produtores rurais e outros grupos sociais que se colocam na frente deles.
Os problemas indígenas são localizados ou ocorrem em todo o Brasil?
Estamos quase nessa região pré-amazônica e daqui para a região amazônica esses problemas são nítidos e cada vez mais agravados, inclusive pelo setor do agronegócio, hidrelétrico e minerador. Temos problemas com a Vale do Rio Doce, no Amazonas, problemas com a usina de Belo Monte no Pará, com o rio Madeira em Rondônia. Então, são vários braços se estendendo para a região norte. Mas em Pernambuco também há problemas sérios e a criminalização, violência e assassinatos de indígenas ocorrem em todo lugar.
Onde tem indígena vivendo em aldeia?
Várias partes do Brasil.
Inclusive Sul e Sudeste?
Sim, tem os Guaranis em Santa Catarina, por exemplo, e tem indígenas vivendo em aldeia e também à margem das estradas e nas cidades.
A situação mais grave é dos indígenas que vivem em aldeias ou cidades?
Isso é relativo. Há vários aspectos. Há indígenas que vieram  estudar e ficam. Indígenas que passaram a se identificar mais com a cidade. Há aspectos negativos e positivos nas aldeias e nas cidades. Por um lado temos as expulsões de seus territórios. Por outro tem a qualificação dos indígenas, que estão estudando e voltando às aldeias ou ficando nas cidades.
É preciso compreender o indígena como um cidadão brasileiro?
Sim, claro. No meio urbano ou em terra demaracada, ele é indígena e brasileiro.
Então porque mal tratamos tantos nossos indígenas? Por que tanto preconceito?
Tem a ver com nossa origem histórica. Esse preconceito se estende a outras populações também como negros, por exemplo. É nossa origem colonialista que ainda se mantém. É um olhar viciado secular, que vê o negro, que vê o indígena como menor capaz.
É a mesma lógica racista?
Isso. Que vê outros povos de forma inferiorizada. E esse racismo  justifica a violência, justifica a idéia de que posso matar, porque nem todos no Brasil são cidadãos e têm direitos de cidadãos, então posso violar seus direitos.
Como está a situação em Marãiwatesédé?
O Exército está montando sua base lá. Os indígenas por enquanto ficam na terra. Mas a situação é complicada.
(Leia sobre isso aqui.)
Os Guarani-Kaiowá estão de fato ameaçando suicídio coletivo?
Não. Isso foi divulgado de forma truncada, o que eles querem é ficar na terra, e vão resistir, com a vida. Nós inclusive divulgamos um vídeo que explica isso. (Veja o vídeo aqui) O que eles garantem é que vão morrer todos  juntos mas na luta, garantem que não vão sair da terra.
Os indígenas estão perdendo direitos conquistados ou faltam políticas públicas para eles?
Essas são questões vinculadas. A PEC 215 e 38 (em trâmite no Congresso Nacional) por exemplo têm textos semelhantes. Ferem o direito aos territórios. A portaria 303, que é da Advocacia Geral da União, toma como base as condicionantes aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a terra Raposa do Sol e estende essas condicionantes para as outras terras indígenas.
Há indígenas em perigo por conta da briga por essas terras?
Claro! A pressão é muito forte.
E quanto as políticas públicas para atendê-los e protegê-los?
Focaria em duas bandeiras mais fortes: educação e saúde. E uma outra bandeiras que é o fortalecimento da Funai, enquanto órgão de governo. Houve um desmonte da Funai. Há uma tendência de escanteamento dela. Fizeram uma reetrturação há pouco tempo que quebraram as pernas da Fundação. Boa parte da recente greve dos servidores desse órgão se deve a isso, muito mais do que por salários. Houve a saída do atendimento da saúde indígena da Funasa e se criou a Secretaria Especial de Atenção à Saúde Indígena. Essa seceretaria era uma reivindicação, o problema é que, ao invés de melhor a situação, piorou. A gente ainda não viu uma melhora. Quanto à educação, em 2010 teve a Conferência Nacional de Educação Indígena, da qual tiramos alguma linhas de atuação, como educação diferenciada, mas efetivamente nada foi concretizado.
O que a população brasileira precisa saber sobre a questão indígena para talvez mudar de opinião e respeitar os povos?
Talvez hoje uma coisa que a gente precisava trazer para a população é a situação de violência que é desconhecida. Os direitos dos indígenas continuam sendo violados, o direito territorial, o direito a educação e saúde, é muito alto o índice de assassinato de indígenas, é altíssimo! Por outro lado, a diversidade que esses povos são, ou seja, apesar de toda violência, continuam se manter como povos diferenciados, com ricas culturas, têm muita coisa a nos ensinar.
É preciso ter orgulho desses povos?
Claro que sim! Se a gente for olhar as influências na  nossa cultura brasileira vamos observar que  temos muito de europeu mas também muito dos indígenas.
O CIMI está completando 40 anos na luta pelos direitos dos índios, como vocês vão marcar a data?
Começamos desde o início do ano (na verdade desde o ano passado). Vamos resgatar a memória de todas as regionais, através do jornal Porantim, e fazer um relato histórica que será transformado em um e-book (livro digital)l. O ponto marcante das comemorações será novembro, de 20 a 23, quando vamos realizar o Congresso do s40 anos, com a participação dos apoiadores e parceiros de lutas indígenas. O evento será na sede do CIMI no Centro de Formação Vicente Canãs em Luziânia (GO). O Congresso será  um momento de avaliação desse histórico, apontando para novos rumos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário