terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Povos Indígenas e Ditadura Militar

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04.02.13 - Brasil
Povos Indígenas e Ditadura Militar
 
Várias organizações
Adital

"paradoxo da tutela” 
- Por um lado, visava proteger as terras e as culturasindígenas; por outro, a transferência territorial dos nativos para liberar áreasdestinadas à colonização e a imposição de alterações em seus modos devida. Esta situação foi chamada pelo antropólogo João Pacheco de Oliveirade "paradoxo da tutela” (1987).
Histórico
"O que aconteceu com os índios no período abrangido pela Comissão Nacional da Verdade? Como foram suas vidas entre 1946 e 1988? Que povos sofreram violências? Quais tipos de violência sofreram? Qual o número aproximado de mortos? Houve Desaparecidos? Quantos foram presos? Quantos torturados? Quem foram os agentes do estado brasileiro que praticaram tais violações contra os direitos humanos e a pessoa do índio? Quais setores da sociedade estavam envolvidos? Houve genocídio? Quem se beneficiou destes atos? Durante a ditadura militar de 1964-1985 os casos se intensificaram? Que consequências tiveram as políticas de desenvolvimento dos governos militares para os povos originários?”(1)
Buscar elementos para responder as questões formuladas acima de modo a subsidiar os trabalhos no eixo indígena da Comissão Nacional Verdade faz parte dos objetivos da pesquisa colaborativa "Povos Indígenas e Ditadura Militar: subsídios à Comissão Nacional da Verdade 1946-1988”, cujo trabalho se debruça tanto sobre a gestão do antigo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) quanto da Fundação Nacional do Índio (FUNAI).
Em maio de 2012, durante assembleia da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo (CJP-SP), foi apresentado aos membros da entidade (também presente Paulo Sérgio Pinheiro, recém indicado para participar da Comissão Nacional da Verdade), um breve relato do levantamento realizado para averiguar a pertinência da criação de um eixo indígena a ser trabalhado pela comissão da verdade, contando para tanto com o apoio e envolvimento da CJPSP, Grupo Tortura Nunca Mais-SP (GTNM-SP), Associação Juízes para a Democracia (AJD) e Armazém Memória, posteriormente contando com a adesão da Kononia Presença Ecumênica e Serviço (Kononia) e Instituto de Políticas Relacionais (IPR).(2)
Paulo Sérgio Pinheiro organizou junto aos demais membros da Comissão Nacional da Verdade uma reunião com as entidades para exposição do assunto, ocorrida em 12/07/2012(3) no escritório regional da presidência da República em São Paulo. Na ocasião foi apresentado vídeo com depoimento do tuxaua Kaxalpynia Runayke sobre a importância da Comissão Nacional da Verdade(4) e entregue alguns documentos que fundamentavam o pedido de inclusão do tema aos trabalhos a serem realizados.
Em 16/07/2012 no Tribunal Popular da Ditadura realizado durante o XXXI ENEH - Encontro Nacional dos Estudantes de História, para instruir o segundo caso referente às violações de direitos humanos dos indígenas no Brasil, foi apresentado o relatório inicial da pesquisa colaborativa(5), contendo a exposição das razões apresentadas aos membros da Comissão Nacional da Verdade, extratos de alguns documentos levantados, exposição da proposta de pesquisa colaborativa e convite para futura adesão aos estudantes de história, contando também com os depoimentos de tuxaua Kaxalpynia e Tiuré Potiguara, que vindo da Paraíba participou como testemunha no julgamento(6). Ao final o juiz José Henrique Rodrigues Torres, presidente do conselho executivo da AJD, proferiu sentença condenando o estado brasileiro pelos crimes cometidos contra os indígenas durante a ditadura militar.
Partimos para a estruturação do trabalho mapeando fontes documentais e visitando os arquivos públicos e privados em que estão depositadas, para conhecer seus bancos de dados, sistemas de indexação e avaliar a documentação reunida. Visitamos as seguintes instituições: Arquivo Nacional - regional Brasília, Centro de Documentação da FUNAI, Arquivo do Museu do Índio no Rio de Janeiro, Instituto Socio Ambiental (ISA) , bem como o Centro de Documentação e Informação da Câmara dos Deputados, além de solicitar informações a diversos arquivos públicos via e-Sic.
Nestas visitas aos arquivos logramos localizar importantes documentos, tais como o filmeArara de Jesco Puttkamer, que oculto por 42 anos, reaparece para a sociedade através de matéria publicada no cadernoIlustríssima da Folha de São Paulo de 11/11/2012 pela jornalista Laura Capriglione(7) e na TV Folha, tendo repercussão internacional com publicação da matéria na versão on-line do Le Monde na França pelo jornalista Nicolas Bourcier(8). Outro documento importante que tivemos acesso foi o relatório da CPI do Índio de 1977(9) onde destacamos o depoimento do Padre Antonio Iasi do CIMI que mostra um quadro importante para contextualização das violações de direitos humanos à época e outro expressivo achado, foi recuperarmos à leitura uma parte significativa de uma documentação desaparecida desde o AI-5, são alguns exemplos dos avanços na busca de documentos probatórios.
Em 02/08/2012 a Comissão Nacional da Verdade criou subgrupos temáticos e a psicanalista Maria Rita Kehl é nomeada coordenadora do eixo que apura as graves violações contra camponeses e indígenas. Em entrevista à Agência Brasil em 26/09/2012 diz: "A comissão ainda está coletando os primeiros elementos para remontar o que de fato ocorreu nesse período, mas, aos poucos, fui percebendo que há um vasto campo de investigação de violações dos direitos das populações indígenas que, na época, eram consideradas mero obstáculo ao desenvolvimento”.
Junto ao trabalho de mapeamento de fontes documentais, passamos a montar a rede de apoio à pesquisa colaborativa para que coletivamente as pessoas e instituições que desejam colaborar, possam participar das atividades de mapear arquivos, localizar documentos, ler e sistematizar informações nas mais de 60.000 páginas de interesse já contabilizadas.
O projeto foi apresentado para a direção do ISA que possui um importante arquivo sobre o assunto, a alguns membros do CIMI (Conselho Indigenista Missionário), bem como antropólogos, indigenistas e indígenas (estes durante a realização da Rio+20) e também a formulação de ferramentas participativas para colaboração à distância pela internet. Deste esforço de atuar em rede, nos chegou através de Geralda Chaves Soares, por exemplo, uma tese que contém estudo sobre o massacre dos índios Pataxós de 1951, o mesmo povo sofreria outro em 1968, pelas mãos de um major-aviador que deveria zelar por sua tutela.
Por 3 vezes em São Paulo nos encontramos com Maria Rita Kehl, que tem tido um trabalho cuidadoso para a definição de casos dada a complexidade e ineditismo do tema, onde pudemos trocar e afinar parâmetros, ritmo, cuidados e condutas, como também sugerir com base em depoimentos coletados pelo Armazém Memória, a necessidade de olharmos além dos casos já assumidos pela Comissão Nacional da Verdade, ou seja, Waimiri-Atroari, Arara e Suruís do Pará, também os Potiguaras da Paraíba, que possui o único caso de indígena exilado no país, após ter sua casa incendiada, ser preso, torturado e ameaçado ao sair da prisão, Tiuré Potiguara foi morar no Canadá onde foi reconhecido como exilado político. Seu caso tramita na Comissão de Anistia.
Os Pataxós da Bahia, Xavantes e Cintas Largas do Mato Grosso, Guarani-Kaiowá do Mato Grosso do Sul(10), a cadeia do Krenak e a ação da Guarda Rural Indígena sob comando da Polícia Militar mineira e presidência da FUNAI à época, junto com o caso dos índios Potiguara, já são linhas de estudo em nossas pesquisas, porém há indicativos de que outros povos atingidos surgirão com a tabulação das informações contidas nos documentos já mapeados ou levantados.
Temos também indícios da existência de várias cadeias e celas clandestinas espalhadas pelo país no período.
Em 16/11/2012 a Comissão Nacional da Verdade publica resolução no Diário Oficial da União que cria grupo de trabalho para apurar "violações de direitos humanos, praticadas por motivação política, relacionadas à luta pela terra ou contra os povos indígenas”(11).
No momento nos preparamos, com o apoio da professora Heloísa de Faria Cruz coordenadora do Centro de Documentação e Informação Científica da PUC-SP (CEDIC) e equipe, para o lançamento da fase 2 da pesquisa colaborativa(12), que consiste no cadastro on-line de voluntários, pesquisadores e colaboradores, para ajudarem num primeiro momento, na leitura e sistematização de mais de mil discursos de autoridades já coletados e outros documentos já levantados, usando formulário on-line para registrar as narrativas de violações contidas no material lido, contribuindo assim para a organização de possíveis casos a serem encaminhados à comissão da verdade e a contextualização da época a ser pesquisada(13).
Ao longo deste período outras importantes iniciativas merecem destaque tanto em relação à questão indígena como a camponesa, tais como a audiência pública promovida pela deputada federal Luiza Erundina na Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, que tratou do massacre dos Waimiri-Atroari(14), a decisão da 6ª Câmara do Ministério Público Federal de investigar casos indígenas ligados ao período da ditadura militar(15), a criação de comitês memória, verdade e justiça pela sociedade civil, que vão focar o assunto indígena no Amazonas(16) e Mato Grosso do Sul, o trabalho do Fórum Terra e Direitos Humanos no Mato Grosso e a Comissão da Verdade dos índios Suruí(17), esta última mostrando o desejo de participação efetiva dos atingidos.
Na temática camponesa destacamos, a Comissão Camponesa da Verdade criada no 1º Encontro Unitário de Entidades e Movimentos Camponeses, e o envolvimento com o tema nos comitês criados em Goiás, Acre, Bahia, em João Pessoa na Paraíba através dos trabalhos do Memorial João Pedro Teixeira e CDH Manoel Matos, além do envolvimento de pesquisadores da UnB que já tratam do assunto(18).
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Leia o documento completo (PDF).
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Notas:
(1) Trecho da peça acusatória apresentada por Marcelo Zelic no Tribunal Popular da Ditadura realizado no XXXI Encontro Nacional dos Estudantes de História, São Paulo, 16/07/2012 - Unifesp. Acesso:https://docs.google.com/document/d/1fJhXqIznkDuzA8-QxRQPHQn2bvUuESbFTqcEZVLwOiw/edit
(2) Ver: Entidades de direitos humanos investigam genocídio indígena na ditadura - Najla Passos. Carta Maior.http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20708&editoria_id=5
(3) Comissão da Verdade poderá investigar massacre de índios ocorrido no período da ditadura militar - Roldão Arruda. OESP. http://blogs.estadao.com.br/roldao-arruda/comissao-da-verdade-podera-investigar-massacre-de-indios-ocorridos-no-periodo-da-ditaduramilitar/
(4) Tuxaua Kaxalpynia e a Comissão Nacional da Verdade: http://www.youtube.com/watch?v=ahPdJqE41nE
(5) Ver: O massacre de indígenas na Ditadura Militar de Lilian Milena http://www.advivo.com.br/materia-artigo/o-massacre-de-indigenasna-ditadura-militar
(6) Ver: O papel da Funai na Amazônia, durante a ditadura por Lilian Milena http://www.advivo.com.br/materia-artigo/o-papel-da-funaina-amazonia-durante-a-ditadura
(7) Ver: Como a ditadura ensinou técnicas de tortura à Guarda Rural Indígena - Laura Capriglionehttp://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/1182605-como-a-ditadura-ensinou-tecnicas-de-tortura-a-guarda-rural-indigena.shtmlVídeo sugere que ditadura ensinou técnicas de tortura para indígenashttp://www1.folha.uol.com.br/multimidia/videocasts/1183962-videosugere-que-ditadura-ensinou-indigenas-a-torturar.shtml
Laura Capriglione aborda a Guarda Rural Indígena http://culturafm.cmais.com.br/comecando/laura-capriglione-aborda-a-guarda-ruralindigena
(8) Acesso: http://www.lemonde.fr/idees/article/2012/11/21/torturer-pour-l-exemple_1793752_3232.html
(9) Comissão da Verdade usará documentos históricos e depoimentos para apurar crimes contra indígenas por Alex Rodrigues http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2012-09-26/comissao-da-verdade-usara-documentos-historicos-e-depoimentos-para-apurar-crimescontra-indigenas
(10) Ver fragmento do depoimento de Valdelice Veron em ato de solidariedade realizado na PUC-SP.http://www.youtube.com/watch?v=bvsAc6CmynA&list=PL6B5846775A3D01C2&index=4&feature=plpp_video
(11) Ver: Comissão da Verdade cria subgrupos temáticos para agilizar investigaçõeshttp://www.forumverdade.ufpr.br/?p=1475e para DOU: http://www.in.gov.br/imprensa/visualiza/index.jsp?jornal=2&pagina=2&data=16/11/2012
(12) O lançamento virtual da campanha de adesão à pesquisa colaborativa está previsto para 10/12/2012 Dia Internacional dos Direitos Humanos. Para ver Edu Viola CARIRI aos Guarani Kaiowá, primeiro vídeo produzido para a campanha acesse: http://www.youtube.com/watch?v=T8HPdJjDQ8s&feature=autoplay&list=PL6B5846775A3D01C2&playnext=1
(13) Ver: Grupo pesquisa violações de direitos dos índios durante ditadurahttp://www.redebrasilatual.com.br/temas/cidadania/2012/11/grupo-tenta-levantar-violacoes-de-direitos-dos-indios-durante-ditadura-militar
(14) Ver: Denúncia do Massacre dos Waimiri-Atroari. na comissão da verdade http://www.youtube.com/watch?v=73kUR_beRPM
(15) Ver: Documentário mostra importância de investigar violação dos direitos humanos dos indígenas por Marcelo Zelic http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=20862
(16) Ver: Comissão da Verdade apura mortes de índios que podem quintuplicar vítimas da ditadura por Guilherme Balza http://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2012/11/12/comissao-da-verdade-apura-mortes-de-indios-que-podem-quintuplicarvitimas-da-ditadura.htme para ler o relatório acessar:http://pt.scribd.com/doc/110548703/1%C2%BA-Relatorio-do-Comite-Estadualda-Verdade-O-GENOCIDIO-DO-POVO-WAIMIRI-ATROARI- leia também: http://urubui.blogspot.com.br/2012/10/por-que-kamna-matoukina.html
(17) Ver: Índios do Araguaia criam comissão da verdade própria para investigar crimes da ditadurahttp://comitedaverdade.blogspot.com.br/2012/11/indios-do-araguaia-criam-comissao-da.html
(18) Ver: Comissão Nacional da Verdade recebe membros de Comissão Camponesa da Verdadehttp://www.cnv.gov.br/noticias/20-11-2012-2013-comissao-nacional-da-verdade-recebe-membros-de-comissao-camponesa-da-verdade

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