segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Belo Monte pode gerar jurisprudência na OEA

ihu
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Belo Monte pode gerar jurisprudência na OEA

As denúncias contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte feitas em fóruns internacionais, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), devem criar jurisprudência para a realização de obras em toda a América Latina.
A reportagem e a entrevista é de Juliano Basile e publicadas pelo jornal Valor, 28-10-2013.
A partir da análise do caso brasileiro, a Comissão de Direitos Humanos da OEA, em Washington, vai definir diretrizes para obras em todo o continente, como a construção de estradas na Bolívia, os conflitos entre mineradoras e comunidades no interior da Colômbia e disputas entre populações maias e empresas que realizam obras no setor de energia elétrica na Guatemala. "Todos os países têm o seu Belo Monte", afirmou o secretário-executivo da comissão,Emilio Alvarez Icaza, cargo mais importante após a Secretaria-Geral da Comissão.
Quando a comissão recomendou a suspensão das obras da usina, em abril de 2011, o governo brasileiro ameaçou sair doSistema Interamericano de Direitos Humanos e retirou o seu embaixador da OEA, situação que persiste até hoje. Dois anos depois, Icaza reconhece que as tensões continuam.
Por outro lado, o secretário elogiou os sinais de aproximação entre Brasil e OEA, como a eleição de Paulo Vanucchi para secretário-geral da Comissão de Direitos Humanos (cargo que deverá assumir em janeiro do ano que vem) e a posse deRoberto Caldas como juiz da Corte Interamericana. Um novo embaixador, no entanto, ainda não foi indicado.
Para Icaza, o caso Belo Monte representa uma nova agenda de direitos humanos para a América Latina. No passado, diz, a OEA tratava de denúncias de torturas e desaparecimentos de pessoas. Agora, lida com tensões envolvendo obras de infraestrutura, comunidades locais e a defesa do ambiente.
A comissão também deverá receber outro grande conflito brasileiro: o mensalão. Assim que os últimos embargos forem julgados pelo STF, réus devem recorrer a Washington. O objetivo será o de fazer com que as condenações do mensalão sejam levadas à Corte Interamericana, na Costa Rica.
Sociólogo, formado pela Universidade Nacional Autônoma do México, Icaza é autor de mais de 80 artigos sobre direitos humanos. Ele defende que a Convenção Americana de Direitos Humanos seja aplicada não apenas pelas supremas cortes dos países, mas pelos tribunais estaduais e juízes de pequenas cidades. No Brasil, são poucos os casos em que se ouve falar de seguir as diretrizes da Convenção Americana, mesmo no STF. Apesar disso, o secretário avalia que o país avança nessa área. ""Estamos certos de que podemos contar com o colosso do Sul."
Eis uma síntese da entrevista.
Efeito Belo Monte
"O efeito Belo Monte aumentou o número de denúncias contra o país. Em 2012, o Brasil sofreu 96 denúncias e chegou a ser o terceiro com mais demandas. É um número relativo, quando se vê que apenas um caso, o de Belo Monte, teve grande impacto. Atualmente, o Brasil está em sexto em número de denúncias. Neste ano já são 65. O México é o primeiro da lista, seguido de Colômbia, Chile, Peru e Argentina. Nesses países, aumentaram as denúncias".
Espaço de tensões
"Belo Monte continua sendo um espaço de tensões. Elas diminuíram, mas o caso segue latente. Belo Monte trata de um debate sobre o modelo de desenvolvimento. É, sim, uma agenda de tensões. O caso se insere num triângulo: desenvolvimento, ambiente e comunidades indígenas. É algo que tem que ser equacionado, pois o modelo de desenvolvimento da América Latina não pode cometer os mesmos erros da Europa, dos Estados Unidos e do Canadá. Em toda a América Latina, os megaprojetos de petróleo, de mineração, as construções de estradas estão gerando muitas tensões. Isso ocorre não apenas no Brasil, mas na Guatemala, no México, em El Salvador, em Honduras, naColômbia, no Suriname, no Chile, na Argentina, na Bolívia e no Equador. O que se vê no mapa do continente são conflitos em ascensão".
Nova agenda
"No caso de Belo Monte, foi dada uma cautelar e há uma discussão que envolve uma nova agenda de direitos humanos. Essa agenda trata do direito ao desenvolvimento. No passado recente, tratávamos de muitos casos de torturas e de desaparecimentos de pessoas. Agora, se fala de consulta aos povos indígenas antes de realizar obras, do respeito ao ambiente sadio, ecologicamente equilibrado, de modelos de desenvolvimento. É uma agenda distinta, um novo desafio para toda a região, e não apenas do Brasil. Belo Monte significa e simboliza essa nova agenda de tensões e conflitos".
Todos os países têm seu Belo Monte
"Belo Monte é um desafio importante e, assim como o caso na Guatemala envolvendo os maias, o da Bolívia com a construção de estradas, o da Colômbia com a mineração, vai gerar jurisprudência na Comissão e na Corte. Todos os países têm seu Belo Monte. Não é o problema do caso em si, mas o que representa em termos de agenda de desenvolvimento. Os Estados, as comunidades indígenas e os projetos de desenvolvimento, todos têm que ver como vão tratar desse tema".

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